MD-45 - A mídia brasileira e a cultura durante a
ditadura militar
Há 45 anos o Brasil atravessava uma
profunda e dolorosa mudança política, social e até mesmo jornalística. O Golpe
de 31 de março de 1964, que derrubou o então presidente João Goulart, acusado
de comunista, foi um importante divisor de águas na história da democracia
brasileira. O período da ditadura militar foi marcado, dentre tantas outras
características, pela violência contra indivíduos e contra a imprensa.
Não é novidade que reportagens que desagradavam o regime fossem
simplesmente proibidas de serem publicadas, sob pena de prisão, tortura e
morte. Nos veículos de grande circulação, receitas culinárias eram publicadas
no lugar de matérias contra o Governo. Com a adoção do Ato Institucional número
5, em 1968, durante o governo de Costa e Silva, ficou-se ainda mais complicado
para os cidadãos e para a imprensa.
Na contramão da censura, foi criado o
jornal semanal O Pasquim. Com humor e ironia, matérias sobre a situação
política da época eram retratadas “discretamente” por jornalistas como Sérgio
Cabral e Tarso de Castro, contando ainda com a participação de cartunistas como
Millôr Fernandes, Ziraldo e outros. O Pasquim, apesar de ir de encontro com os
interesses dos militares, ia ao encontro do interesse público. Era um tipo de
mídia que manifestava características culturais de uma determinada época e de
uma determinada população, embora corresse todo o risco da repressão. Mas a
publicação não contava somente com noticias do Governo ou manifestações. Era
basicamente comportamental, pois abordava assuntos como drogas, sexo,
feminismo, divórcio, dentre outros. O lado político foi sendo desenvolvido
conforme o amadurecimento da repressão da ditadura. Inúmeros jornalistas da
redação foram presos e torturados a mando dos militares e até mesmo bancas de
jornais que vendiam o semanário alternativo eram alvo de atentados a bomba. O
Pasquim sucumbiu no início da década de 90, com seu último exemplar publicado
em 11 de novembro de 1991.
O Pasquim foi um elemento
contracultural, uma vez que valores e ideias de uma conjuntura eram
questionados, embora maquiadamente.
Um outro veículo importante do
século XX foi a revista O Cruzeiro. Apesar de sua criação ter sido dada muito
antes do período do regime militar, seu último exemplar foi publicado durante
essa época. O Cruzeiro fazia parte das publicações dos Diários Associados, o
maior conglomerado de comunicação do Brasil, fundado por Assis Chateaubriand.
Entre os variados assuntos abordados, eram destaques notícias sobre os astros
de Hollywood, atletas famosos e cinema. Os elementos da midcult elencados
naquela revista eram usados para chamar a atenção da massa para os malefícios
da ditadura e até mesmo burlar possíveis censuras. Matérias de interesse
público eram sempre produzidas e elementos da off-Broadwayeram
uma constante na revista (uma vez que reportagens sobre a baixa cultura da
época eram uma constante). O Cruzeiro misturava realidade com ficção, buscando
de uma forma alternativa expor os problemas da sociedade da época. A cultura,
em geral, era o centro das atenções do conteúdo da revista.
Não são apenas importantes
veículos midiáticos que fazem parte do leque de cultura de uma determinada
época. A presença de O Pasquim e O Cruzeiro foram importantes na construção da
imprensa que temos hoje, seja pela forma, seja pelo conteúdo. A cultura era
retratada naquelas revistas de forma a expressar para os leitores de um modo
claro, certas vezes despojado, e quase sempre irônico, fugindo da repressão
militar.
Acerca do assunto estudado, um
outro aspecto cultural que pôde ser observado durante os 21 anos do regime
militar foi a Jovem Guarda. Fundado pelos cantores Roberto Carlos, Erasmo
e Wanderléia, o movimento teve início na metade da década de 60. Uma mistura de
música, moda e comportamento marcou época e gerações, influenciando no modo de
agir e pensar de milhões de jovens brasileiros. A midcult determinada
pela Jovem Guarda consistia em arrastar, basicamente, os jovens, mas, aos
poucos, os mais velhos também foram atraídos pelo movimento. O período de
decadência da Jovem Guarda deu-se pela ascensão de um novo grupo. Também
formado por compositores, a Tropicália foi um dos responsáveis pelo
“esvaziamento” do movimento liderado pelo cabeludo Roberto Carlos.
“A Tropicália é uma Jovem Guarda
com consciência das coisas”. Assim Erasmo Carlos definiu o manifesto liderado
por Gilberto Gil e Caetano Veloso. Com influência da cultura pop nacional, o
Tropicalismo também tem ligações com o movimento antropofágico das décadas de
20 e 30 (liderado por expressivos artistas como Anita Malfatti, Mário de
Andrade, Tarsila do Amaral, dentre outros). O misto de poesias de vanguarda
concretista nas letras das canções com a estética do pop art eram
características midcult,
uma vez que eram mesclados o melhor da hype (poesias
concretistas) com o melhor do conceito de off-Broadway (
canções pop que estão em ascendência para a hype).
O movimento Tropicalista
não se constitui apenas na música popular brasileira. O cinema também sofreu
influências . O Cinema Novo, de Glauber Rocha, tinha como característica fugir
das grandes estruturas hollywoodianas e mostrar a realidade brasileira ao povo.
Com “uma câmera na mão e uma ideia na cabeça”, Glauber Rocha e outros cineastas
como Nelson Pereira dos Santos, Cacá Diegues e Joaquim Pedro de Andrade faziam
de uma produção barata de cinema uma grande história a ser contada a muitas
gerações. Era a contracultura chegando, mais uma vez, às grandes massas.
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