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Sexta-feira, 27 de Junho de 2014 | ISSN
1519-7670 - Ano 18 - nº 804
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OI
NA TV
MD-15 - Wilson Simonal volta à mídia
Por
ilia Diniz em 10/06/2009 na edição 541
Em 1971, o cantor de música popular
Wilson Simonal vivia o auge de seu sucesso profissional. Dono de um enorme carisma,
era o rei do suingue. Negro, criado em uma favela carioca, filho de uma
empregada doméstica, seu único rival no show business era o cantor Roberto
Carlos. Simonal vendia milhares de discos, apresentava-se para multidões no
Maracanãzinho, no Rio, e contava com importantes contratos publicitários. Mas o
sucesso foi bruscamente interrompido. O cantor terminou seus dias no
ostracismo, sofrendo de alcoolismo e de depressão. A partir de uma declaração
até hoje não comprovada, a mídia rotulou o cantor de "dedo-duro" e
alardeou que Simonal era informante da ditadura militar. O Observatório da Imprensa exibido
na terça-feira (9/6) pela TV Brasil discutiu a postura da imprensa neste caso,
que voltou a ser lembrado com o lançamento do filme Simonal – Ninguém sabe o duro que dei.
A imagem do cantor começou a ser abalada
quando foi acusado de acionar o extinto Departamento de Ordem Política e Social
(DOPS) para prender e espancar seu ex-contador e extrair dele uma confissão de
roubo. Simonal suspeitava que o ex-funcionário havia dado um desfalque nas
contas de sua empresa. Durante um depoimento no processo que investigava a
prisão do ex-contador, o inspetor Mário Borges justificou a ação do órgão com
uma polêmica afirmação da qual não tinha provas: "Simonal é há muito tempo
informante do DOPS e de outros órgãos policiais, tendo fornecido várias vezes
informações positivas sobre atividades subversivas". A imprensa
rapidamente condenou o cantor. O jornal carioca de oposição O Pasquim foi um dos mais críticos.
O debate ao vivo contou com a
participação em São Paulo de Micael Langer, diretor
e roteirista do documentário sobre Simonal. Langer é produtor, roteirista,
diretor e pesquisador em curtas-metragens, vídeos institucionais e filmes
publicitários. O pesquisador de música popular brasileira Ricardo Cravo Albin
também participou no estúdio de São Paulo. Escritor, jornalista e historiador,
produziu e idealizou o Dicionário Cravo Albin
da MPB e fundou o Instituto Cultural Cravo
Albin, uma sociedade civil que promove e incentiva atividades de caráter
cultural. No Rio, o programa contou com a presença do jornalista Arthur
Poerner, que teve seus direitos políticos suspensos e viveu exilado na Europa
por 14 anos. Poerner trabalhou no Correio da Manhã, O Estado de S.Paulo, Jornal do Brasil, Tribuna da Imprensa e O Pasquim, entre
outros veículos. É autor de diversos livros, entre eles O Poder Jovem, sobre a participação política dos
estudantes brasileiros.
Antes do debate ao vivo, o jornalista
Alberto Dines comentou os principais assuntos da semana. O primeiro tema da
coluna "A Mídia na Semana" [ver abaixo] foi a polêmica em
torno do blog da Petrobras. Para Dines, a reação da grande imprensa foi
exagerada: "A estatal errou, errou sim, ao decidir que publicará as
perguntas dos repórteres antes que suas matérias sejam publicadas. Mas a
Petrobras tem todo o direito de publicar as informações completas depois da
divulgação pelo veículos para que o leitor compare as duas versões". Em
seguida, Dines comentou a cobertura do acidente com o voo 447 da Air France
(31/5), que transportava 228 pessoas de diferentes nacionalidades. O jornalista
ressaltou que as buscas estão sendo realizadas por militares brasileiros e
franceses, mas que a informação da participação francesa foi omitida dos brasileiros.
O último assunto da seção foi a publicação de fotos comprometedoras feitas em
na mansão do primeiro ministro italiano Silvio Berlusconi, na Sardenha.
Efeito bola de neve
Em editorial sobre a relação dos meios
de comunicação com o cantor Wilson Simonal, Dines relembrou que nos anos de
1970 a imprensa vivia sob regime de censura e, principalmente, autocensura.
"Mesmo assim espalhou-se a convicção de que Simonal era um colaborador dos
órgãos de repressão. Indícios foram transformados em evidências, estas em fatos
e, de repente, a sua confissão de que era um homem de direita foi transformada
em confissão de ser cúmplice dos torturadores", disse. O jornalista
destacou que o sucesso do cantor "incomodava" diversas esferas da
sociedade. "Nos Estados Unidos, a era McCarthy também produziu inúmeras
injustiças. A diferença com os nossos anos de chumbo é que se estenderam ao
longo de duas décadas. Nestas circunstâncias as injustiças só podem ser
reparadas postumamente" [ver íntegra abaixo].
A reportagem exibida no Observatório entrevistou o advogado
Antônio Carlos Biscaia, que pediu a condenação do cantor no processo movido por
seu ex-contador. Biscaia contou que, ao examinar o processo, concluiu que havia
comprovação de crime de extorsão praticado por Simonal, pelo motorista do
cantor e três agentes do DOPS. No mesmo dia em que Simonal recebeu um
comunicado de que o ex-contador havia entrado na Justiça para requerer seus
direitos trabalhistas, o ex-funcionário foi preso e torturado para assinar um
documento desistindo do processo. "A prova era inquestionável",
disse. Biscaia comentou que o caso teve uma grande repercussão na época.
Diversos veículos afirmaram que o cantor colaborava com a ditadura. "Se
ele se utilizou de integrantes da repressão política do Estado para a
satisfação de um interesse pessoal, isto revela que tinha prestígio e
conhecimentos dentro do regime militar", disse.
Para
o jornalista e pesquisador musical Sérgio Cabral, também entrevistado na
reportagem, o fato de Simonal ser considerado "dedo-duro" aniquilou
com a carreira do cantor. "Isto é uma coisa que brasileiro não perdoa.
Perdoa até ladrão, perdoa tudo. Mas `dedo-duro´, não", disse. O jornalista
explicou que a imprensa de oposição ao regime militar não podia "espinafrar"
o governo porque a censura não permitia que as matérias fossem publicadas. A
saída era "espinafrar" quem apoiava o regime. Nomes como Nelson
Rodrigues, Gustavo Corção e Roberto Campos não foram perdoados pelos meios de
comunicação. Sérgio Cabral avalia que Simonal "não tinha cabeça de
político, de ser espião", mas que o cantor tinha importantes contatos no
regime. "Ele não tinha ideologia de ser contra ou a favor da
esquerda", disse.
Muitas
vozes da mesma história
No
debate ao vivo, Dines pediu para Micael Langer explicar o porquê de o advogado
Antônio Carlos Biscaia, peça-chave no processo contra Simonal, não ter sido
entrevistado para o filme. Langer explicou que outros nomes que fizeram parte
da história contada no documentário não puderam ser incluídos – como Jairzinho,
Hebe Camargo e César Camargo Mariano – por uma questão de contingência de
produção. O filme demorou cerca de sete anos para ser concluído e foi dirigido
por três profissionais – Langer, Claudio Manoel e Calvito Leal. Muitas vezes,
era difícil conciliar as agendas. Um dia relembrado por Langer como fundamental
para a produção foi o da entrevista com o ex-contador de Simonal. Neste
momento, avaliaram que já havia material suficiente para editar o documentário.
"O
balanço alegre de Simonal incomodava a quem queria música de combate?",
questionou Dines no debate. Ricardo Cravo Albin considera que havia um
"patrulhamento musical" no período da ditadura militar. "Sempre
houve uma crítica que queria o que achava ser o melhor, como os grandes nomes
dos festivais de música. Queriam música de mais densidade e de mais
respeitabilidade histórica, que contribuísse para derrubar o regime
autoritário", explicou. Segundo ele, para estudar a polêmica em torno de
Simonal é preciso analisar a "época de exacerbação em que tudo ocorreu".
Simonal tinha um "extraordinário talento", mas sua música "mais
leve" não era tão aceita pelo intelectuais quanto o trabalho de outros
artistas que se destacaram no período, como Chico Buarque, Edu Lobo, Caetano
Veloso e Gilberto Gil. Cravo Albin disse que Simonal era um mito para um grande
número de brasileiros e lembrou ter testemunhado um show no Maracanãzinho
lotado onde o cantor "conduziu a massa".
Arthur Poerner comentou que em um
"estado policial" cria-se um clima de suspeitas infundadas. Como a
censura impedia que se falasse da ditadura, buscavam-se alternativas e muitas
vezes criavam-se suspeitas sobre pessoas que colaboravam com o regime.
"Simonal deu motivo para isso pela maneira como se comportou no
caso", avaliou. Para Poerner, Simonal foi o primeiro pop star negro do Brasil. Durante
muito tempo, o jornalista "teve a impressão" de que o cantor era um
colaborador da ditadura militar. Somente a partir de uma entrevista de Nelson
Motta ao Pasquim21,
anos depois, foi convencido do contrário. Poerneer comentou que o cantor tinha
o perfil "marrento". Mesmo depois de o caso ser encerrado, declarava
ser "de direita e simpatizante da ditadura". O jornalista relembrou
que durante o tempo em que viveu exilado na Europa presenciou situações nas
quais pessoas inocentes passavam a ser suspeitas de colaborar com regimes de
exceção.
Ainda um tabu
O
público está "descobrindo e redescobrindo" o caso de Simonal a partir
do documentário, na visão de Micael Langer. O diretor e roteirista explicou que
o filme foi produzido para atrair diversos públicos. Pretendia ser um produto
leve para agradar aos mais jovens e que "tocasse quem viveu naquele
período". Langer comentou que muitas pessoas saem das salas de exibição
cantarolando as músicas de Simonal. Houve casos de senhoras que deixaram o
cinema chorando e agradecendo aos realizadores por "terem trazido de volta
o Simonal para a vida delas". Langer acredita que a história do cantor
"precisava ser contada" e comentou que ainda há receito em abordar
esta polêmica. É preciso chamar a atenção para o "tamanho da pena"
que a sociedade impôs ao cantor.
Ricardo
Cravo Albin classifica a o caso de Simonal como uma "tragédia do
poder". Um negro de origem humilde alcança grande sucesso e é roubado por
seu contador. "Os poderosos acham que podem tudo", avaliou. O
pesquisador musical não acredita que o cantor fosse "dedo-duro", mas
"pediu um castigo" para o ex-funcionário que havia cometido um delito
e não avaliou a consequência trágica que a ação ocasionaria. Na opinião de
Cravo Albin, houve erro da parte do cantor, mas a punição foi prolongada por
toda a vida. "Wilson Simonal morreu sem anistia", disse.
***
Injustiça
incômoda
Alberto
Dines # editorial do Observatório da Imprensa na TV nº 506, exibido em 9/6/2009
Bem-vindos ao Observatório da Imprensa.
A
injustiça incomoda, sobretudo quando a injustiça é percebida
retrospectivamente. Quando já não há nada mais a fazer é que se tem condição de
perceber a dimensão da injustiça.
O cantor Wilson Simonal morreu há nove
anos, acabrunhado com as acusações de que era um delator e colaborador dos
órgãos de segurança durante a ditadura. O documentário Ninguém sabe o duro que eu dei é
uma dolorosa reconstrução dos anos de chumbo, quando a intolerância do regime
espalhou-se e impregnou todos os cantos e recantos da sociedade.
A
mídia estava sob censura, na realidade em regime de autocensura, mesmo assim
espalhou-se a convicção de que Simonal era um colaborador dos órgãos de
repressão. Indícios foram transformados em evidências, estas em fatos e, de
repente, a sua confissão de que era um homem de direita foi transformada em
confissão de ser cúmplice dos torturadores.
Simonal
cometeu um crime: pediu aos amigos policiais que castigassem o seu contador que
lhe dera um desfalque. Este crime poderia ter sido punido se o clima de
intolerância e suspeição não permeasse o comportamento de todos.
A
verdade é que Simonal incomodava muita gente: incomodava os politicamente
corretos e os incorretos, os que gostavam da Tropicália e os que não suportavam
o balanço da pilantragem.
Nos
Estados Unidos, a era McCarthy também produziu inúmeras injustiças. A diferença
com os nossos anos de chumbo é que se estenderam ao longo de duas décadas.
Nestas circunstâncias as injustiças só podem ser reparadas postumamente.
***
A
mídia na semana
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Discutir a imprensa é bom para a imprensa e bom para a sociedade, mas é preciso
que esta exposição seja sistemática, contínua e não espasmódica. A reação da
grande imprensa ao novo blog da Petrobras é exagerada. A estatal errou, errou sim,
ao decidir que publicará as perguntas dos repórteres antes que suas matérias
sejam publicadas. Mas a Petrobras tem todo o direito de publicar as informações
completas depois da divulgação pelos veículos para que o leitor compare as duas
versões. Esta tempestade é artificial.
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A tempestade verdadeira, catastrófica, foi enfrentada pelo Airbus A-330 da Air
France. Depois da comoção e da solidariedade, a mídia se soltou e escolheu o
pitot, sensor de velocidade, como bode expiatório. É muito cedo para apontar
causas. O Estado francês está atento e já começou a apurar responsabilidades
numa ação de homicídio culposo. Convém lembrar que os desastres da Gol e da TAM
em 2006 e 2007 ainda não foram esclarecidos.
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A busca pelos destroços e desaparecidos está sendo empreendida conjuntamente
pelos militares brasileiros e franceses. Mas só soubemos da participação
francesa ontem [8/6], quando nossas autoridades revelaram que os gauleses
haviam errado na contagem dos corpos: eram 16 e não 17. O cidadão brasileiro não
poderia ignorar esta cooperação. Omiti-la é uma ofensa a um brasileiro quase
francês chamado Santos Dumont.
** A esquerda perdeu as eleições
européias mas dois dias antes o ícone da centro-direita, Silvio Berlusconi,
estava nas primeiras páginas dos principais jornais do mundo graças ao furo do
espanhol El País mostrando
suas orgias sexuais realizadas com os recursos do Estado italiano. Berlusconi
perdeu Kaká, perdeu a mulher e não está longe o dia em que será pendurado como
Benito Mussolini.
***
Jornalista
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