MD-46
- Grande imprensa apoiou golpe militar e a ditadura até 1968, revela
pesquisa da FFLCH
João Ortega / Agência USP de Notícias
A
grande imprensa, em geral, valoriza a sua posição de crítica e resistência no
período da ditadura militar no Brasil. Colocam-se como porta-vozes da
democracia e defensores dos interesses populares nesse momento histórico.
Entretanto, uma pesquisa da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas
(FFLCH) da USP verificou que o papel dos dois maiores jornais no início do
regime militar foi complexo, com apoio ao golpe, à ditadura e de condenação do
trabalhismo e de movimentos sociais.
O
estudo do professor de história Eduardo Zayat Chammas analisou editoriais dos
veículos Correio da Manhã e Jornal do Brasil entre 1964, ano do golpe, e 1968,
ano de implantação do Ato Institucional 5 (AI-5). Os dois jornais, nesse tipo
de texto que expõe a opinião do veículo, mostraram-se a favor da queda de João
Goulart do poder. O primeiro, inclusive, publicou editoriais na capa pedindo a
saída do presidente e se declarou “herdeiro dos ideais democráticos da
revolução de 1964”, segundo Chammas.
Durante
a ditadura, os dois jornais trouxeram algumas ressalvas em alguns momentos
pontuais. Por exemplo, depois da passeata dos 100 mil em protesto contra os
militares, em junho de 1968, o Jornal do Brasil questiona alguns pontos do
regime. O Correio da Manhã questionou, nos primeiros quatro anos, as medidas
que apresentassem alguma restrição à liberdade de imprensa.
O
professor aponta que os dois jornais tinham um alvo de críticas em comum: os
trabalhistas. “Eram contra o projeto social desenvolvimentista que
possibilitava mudança nas estruturas sociais, na estrutura de poder”, explica.
“Só era legítimo o poder que vinha das instituições formais da democracia
liberal, como o poder legislativo ou a própria imprensa, considerada a
porta-voz da opinião pública. Os movimentos das ruas não tinham voz para esses
jornais”. Um exemplo disso é que ambos foram a favor do Estatuto da Terra, que
nega uma reforma agrária voltada ao povo e traz grandes empresas capitalistas
para o campo.
O
movimento estudantil, apesar de criticar os militares, foi bem noticiado até
1968 pelo Correio da Manhã, pois, segundo o pesquisador, “este jornal dialogava
um pouco mais com as classes médias, de onde vinham esses estudantes”.
Entretanto, naquele ano, as tensões políticas eram maiores, e as ações dos
militares mais cerceadoras ao movimento. Os estudantes estavam tomando posições
mais radicais e apresentando um discurso mais parecido com o da esquerda
clássica. Sendo assim, o veículo retirou o apoio ao movimento.
Atos institucionais
No
estudo, intitulado A ditadura militar e a grande imprensa: os editoriais do
Jornal do Brasil e do Correio da Manhã entre 1964 e 1968, a postura dos jornais
sobre os atos institucionais, (AI) que eram uma série de decretos que o governo
militar anunciava, com novas normas a serem cumpridas, teve importância. Até o
quarto AI, o Jornal do Brasil não contestou nenhum deles. O Correio da Manhã,
por sua vez, fez críticas leves às medidas, nesses atos, que iam contra as
liberdades individuais, principalmente de expressão.
Com
o AI-5, que diminuiu muito as liberdades dos cidadãos, implantou a censura a
toda forma de manifestação contra o governo e aumentou muito mais o controle do
estado sobre a imprensa, a postura dos jornais mudou. “Os dois veículos
dialogavam com a classes média e a burguesia, que foram mais afetadas depois do
AI-5”, esclarece Chammas.
Veículos
A
escolha do Jornal do Brasil e do Correio da Manhã aconteceu por diversos
motivos. O estudo, que foi orientado pelo professor Marcos Francisco Napolitano
de Eugênio, optou por jornais com a sede no Rio de Janeiro, já que “a cidade
havia deixado de ser capital havia poucos anos e ainda era palco da cena
política no país”, segundo Chammas.
Além disso, diferentemente de jornais mais
populares, os escolhidos dialogavam com o público que tinha mais influência na
política do País, classes mais altas. Eles também não eram vinculados a um
partido específico. Outros fatores determinantes são que eram os dois jornais
com maior tiragem no país e tinham circulação nacional.
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